“As instituições estão funcionando” para dar sustentação ao golpe de Estado

 

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O tempo é o dono da verdade, derrete a mentira, a enganação e a hipocrisia na luz dos dias.

O caos institucional que o Brasil está vivendo poderia ter sido evitado se o STF estivesse à altura de sua função, de fazer cumprir a Constituição, de guardar o Estado democrático de direito, e tivesse colocado na pauta do tribunal, como prioridade máxima do país, o exame do pedido de anulação do impeachment da presidenta Dilma.

O bordão “as instituições estão funcionando” tem sido repetido à exaustão com desfaçatez, a começar por Michel Temer, Cármen Lúcia, presidente do STF, Deltan Dallangnol, coordenador da força tarefa do Ministério Público, que atua na Operação Lava-Jato, o juiz federal Sérgio Moro, Rodrigo Maia e Eunício Oliveira, respectivamente presidentes da Câmara e do Senado, todos responsáveis pela balbúrdia que arrasta o país para a beira do precipício de uma convulsão social talvez inédita.

“As instituições estão funcionando” para dar sustentação ao golpe de Estado e ao governo ilegítimo, escancaradamente corrupto, fruto de uma peça acusatória falsa e da compra de votos de parlamentares para derrubar a presidenta Dilma e manter Temer.

A peça do Tribunal de Contas da União, órgão auxiliar do Congresso Nacional, que fundamentou o impeachment, martelada na mídia como “pedaladas fiscais”, foi elaborada pelo ministro Augusto Nardes, que está sendo investigado formalmente pela Operação Zelotes, por corrupção.

Dos nove ministros do TCU, quatro estão sendo investigados por receber propinas, entre eles, o presidente do tribunal, Raimundo Carrero, acusado de receber R$ 1 milhão da empreiteira UTC para favorecimento num processo.

O Judiciário, que está na berlinda como nunca esteve, por subordinar os demais poderes da República, deixou a máscara cair, mostrou que o país não tem justiça coisa nenhuma, mas uma casta aristocrática de magistrados, ressalvadas as devidas exceções, tomada por sentimento monárquico, indiferente a qualquer compromisso com a construção institucional da nação democrática.

Ao lado dos procuradores, o Judiciário tem se mostrado mais interessado nos privilégios da casta, na escalada de aumentos salariais (juízes 41% e procuradores, 16%), reivindicados sem o menor constrangimento, mesmo sabendo da perigosa crise fiscal que vive o país com universidades fechando por causa de cortes de recursos, com a população vivendo uma situação dramática nos hospitais, decorrentes do desgoverno.

Além disso, tem agido, na maioria das vezes, com poder discricionário absoluto, condenando e absolvendo conforme “convicções” e conveniências. Um poder baseado na autonomia política, administrativa e financeira conquistada na Constituição de 1988, no auge da luta pela democracia no Brasil, mas que demonstra não estar à altura das prerrogativas constitucionais de que desfruta, nem preparado para o exercício da magna função pública num regime democrático.

O STF, cuja principal função é fazer cumprir a Constituição e guardar o Estado democrático de direito, tem sido convenientemente omisso em certas situações ou age como colaborador do golpe de Estado tomando decisões por vezes contraditórias.

Podem ser citados vários casos nos quais o STF revelou suas misérias. Um dos mais vergonhosos, que expôs a anuência ao golpe de Estado e à ilegalidade, foi o das decisões: uma que impediu a nomeação do ex-presidente Lula, pela presidenta Dilma, para o cargo de ministro da Casa Civil, e outra que permitiu a nomeação de Moreira Franco, por Temer, para assumir o cargo de ministro-chefe da Secretaria Geral da Presidência da República, na mesma situação.

Soma-se a isso, a impunidade do juiz Sérgio Moro, que gravou, na época da nomeação do ex-presidente Lula, telefonemas violando flagrantemente a privacidade da presidenta Dilma, protegida por leis e pela Constituição. Um abuso de autoridade que deveria ter sido enquadrado como crime de segurança nacional, mas nada aconteceu ao juiz.

Uma das decisões mais indignas do STF, tomada recentemente, foi a jurisprudência criada em favor do senador Renan Calheiros, então presidente do Senado e do Congresso Nacional, sendo ele réu, para que na cadeia sucessória, pudesse ocupar a presidência da República.

Houve até registro, em foto para posteridade, da presidenta do STF, Cármen Lúcia, ao lado do senador Renan Calheiros.

Quando são discutidas as decisões dos tribunais, muitas vezes se esquece de que os ministros indicados para compor o STF e o TCU, por exemplo, são submetidos ao Senado e aprovados pelos votos dos senadores das maiores bancadas na Casa.

Como o poder econômico elege a maioria parlamentar, devem lealdade a quem os apoiou na aprovação para o cargo de ministro do tribunal.

Isso explica as ligações perigosas entre magistrados e políticos, vistos em encontros em noites silenciosas, tratando de assuntos inconfessáveis.

O Ministério Público tem também suas misérias, quando, por exemplo, pediu ao STF que considerasse um tipo de “caixa dois”, que seria para campanha eleitoral, e outro que os procuradores julgam ser “propina”. Uma lógica mirabolante que serve para proteger alguns e incriminar outros.

E se submete a outra construção mirabolante do procurador Deltan Dallagnol, a de formular denúncias e imputar crimes, sem provas, contra alguns, de forma arbitrária, sem observar as garantias constitucionais.

O juiz Sérgio Moro e o procurador Deltan Dallagnol têm papel de destaque na balbúrdia nacional ao pegar um caminho marginal, desviando a operação Lava-Jato para o campo político, perseguindo, cometendo injustiças a olhos vistos, como, por exemplo, a acusação e condenação do ex-presidente Lula, sem provas. O julgamento público que se fez do ex-presidente com um power point numa entrevista coletiva, enfim, a atuação do juiz e do procurador é um capítulo à parte no caos institucional.

O Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e o Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP), por sua vez, têm funcionado mais como instituições corporativas de proteção das respectivas categorias e não de punição dos indignos das funções públicas tão caras à democracia. Basta verificar as mais recentes decisões dos conselhos.

De todos os poderes, o Judiciário é o mais seguro do sistema para manutenção da ordem conservadora dos de cima.

Tem o aparato policial disponível para usar conforme suas “convicções”, não depende de eleições e pode, por incrível que pareça, submeter os demais poderes da República, que têm soberania e prerrogativas garantidas pelo voto do cidadão. Ou seja, coloca toda a nação a seus pés.

O golpe de Estado está nas páginas da história do Brasil e o comportamento do STF figura, mais uma vez, na parede da memória da vergonha nacional.

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