O brasiliense é, antes de tudo, um réptil.

Foto: Laurez Cerqueira
 

Quando a seca chega a Brasília o sol nasce tórrido e segue o dia torrando tudo.

Árvores peladas, chão coberto de folhas, gente feito répteis serpenteando os caminhos poeirentos dos gramados pardos da cidade.

No fim do dia, uma bola vermelha enorme, disforme, tremendo no horizonte, atrás da lente feita de fuligens e de partículas suspensas, é engolida pela boca seca da noite.

É quando tenho vontade de ir embora a procura de sombra e água fresca.

Mas eis que o solo fermenta, a seiva sobe por caules desfolhados e faz desabrochar flores coloridas nas pontas dos galhos.

Matuto que sou, fico encantado com os manacás, os ipês, as sucupiras, os angicos brancos,  e com todas as árvores atrevidas do cerrado que desafiam a seca, meio que me distraindo com isso a espera das primeiras chuvas.

Quando a chuva cai, tudo brota, tudo se renova, e um verde viçoso, novinho em folhas, tinge a paisagem.

Os insetos que se enfiaram debaixo da terra para se protegerem da intempérie, grudados nas raízes úmidas de plantas e árvores, saem dos buracos em que se meteram, escalam os troncos em verdadeiras expedições, em busca do néctar das flores, passeiam nas cores das pétalas e se fartam.

A passarada, na espreita, espera uma suculenta formiga distraída, uma joaninha, uma alegre cigarra zoando por aí e crau! Glup! Em segundos engole os insetos vivos.

De papo cheio, canta em festa, de galho em galho.

Aí me acalmo.

 

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