Temer no palácio e Cunha no presídio
O barulho do ferrolho da grade ao fechar a porta da cela onde reside agora o ex-poderoso presidente da Câmara, Eduardo Cunha, deve estar ecoando nas profundezas da consciência dele.
Se havia o plano de derrubar Dilma e em seguida estancar as investigações, se safar das ações na justiça, continuar comandando o conglomerado de lobbyes de corporações empresariais e eleger quem quisesse com uma montanha de dinheiro de propinas, parece que deram com os burros nágua.
Temer está no Palácio, mas Cunha no presídio.
Ao olhar ao redor dentro da cela, Cunha deve ter caído na real e percebido que, tudo bem, sua prisão não teve espetáculo, não teve algemas, mas só restou-lhe a delação premiada e nada mais.
O ferrolho da porta da cela lacrou a carreira política de Cunha. Tudo indica que todos os compromissos que ele tinha no meio político zeraram. Não há mais perspectiva de volta ao cenário do poder.
Cunha vai cuidar da pele dele e da pele da sua família. Já contratou um advogado especialista em delação premiada. Por isso o Palácio do Planalto foi tomado pelo sentimento de interinidade. Tudo pode acontecer.
Imagina se Cunha resolver divulgar gravações que por ventura fez para se proteger, ou de todos os encontros que teve em tratativas com políticos, magistrados, policiais, jornalistas, empresários, durante todo o período que atuou como operador de lobbyes no Congresso Nacional e nos governos.
Curiosamente, ao invés de apenas os políticos mais ligados a Cunha estarem suando frio, de medo, comentaristas, porta-vozes dos barões da mídia, também estão roendo as unhas. Começaram a desqualificar o instituto da delação premiada.
Reinaldo Azevedo, o mais rabugento deles, em sua coluna, demonstrou estar em pânico com um possível acordo de delação premiada de Eduardo Cunha. Estranho, não?
De todos os ramais do propinoduto investigado pela Operação Lava-Jato, os do Porto de Santos e de Furnas devem estar tirando o sono de Michel Temer, Elizeu Padilha, seu braço direito na Casa Civil, e de Aécio Neves.
A famosa “emenda Tio Patinhas”, pendurada como um jabuti na Medida Provisória dos Portos, em 2013, sob comando de Eduardo Cunha, quando era líder da bancada do PMDB, na Câmara, resultou em gordas doações de campanha eleitoral, do Grupo Libra, que opera no Porto de Santos, para eleger Temer Vice-Presidente da República e deputados do partido dele. Esse é apenas um exemplo do que Eduardo Cunha pode querer delatar. Sem falar nos rolos da Petrobras e outros setores.
Mas isso, perto das investigações sobre escândalos no Porto de Santos é pouco. A influência e as nomeações de Temer no Porto de Santos são velhas conhecidas da Polícia Federal, do Ministério Público, do Judiciário e da impressa, desde o tempo que Eliseu Padilha era Ministro dos Transportes do governo Fernando Henrique. Os processos estão parados desde então.
Os ministros Moreira Franco, Eliseu Padilha e o Presidente da Câmara, Marco Maia, estão atravessados na garganta de Cunha desde o acachapante placar de 450 votos a 10, na votação que cassou o mandato dele.
Cunha deve ter se sentindo usado e descartado como bagaço de laranja. Chegou a hora da vingança e ele sabe, como ninguém, servi-la em banquete aos inimigos. Para quem elegeu mais de 200 parlamentares e mantinha sob seu tacão, obter apenas 10 votos fiéis na votação não é para menos.
Aécio sumiu. Fugiu da imprensa quando foi indagado sobre a prisão de Cunha. Ele sabe que a represa dos escândalos de Furnas, em Minas, está rachada, prestes a ser rompida com uma delação de Cunha e a lama descerá com ele morro abaixo.
É possível que desta vez a Fundação Bogard & Taylor, sediada na capital Vaduz, no Liechtenstein, o mais fechado paraíso fiscal do mundo, venha à tona. Até agora conseguiram mantê-la debaixo de sete chaves.
Documentos em poder da Polícia Federal, constantes de uma pasta amarela, de número 41, apreendida no escritório e na residência do doleiro Robert Muller, no Rio de Janeiro, provam que ele abriu uma conta secreta, de nome Bogard & Taylor, num banco no paraíso fiscal em Vaduz.
Segundo os documentos, o nome da conta teria sido escolhido por Inês Maria Neves Faria, mãe e sócia de Aécio Neves. Qual finalidade de uma conta de uma fundação dessa num paraíso fiscal?
Segundo reportagem da revista Época, https://goo.gl/KmunYw, a apreensão dos documentos comprobatórios da conta secreta foi realizada no dia 08 de fevereiro de 2007, numa operação da Polícia Federal. De lá para cá, o assunto dorme pesado sono nos arquivos do Ministério Público Federal.
O doleiro é um velho conhecido da Polícia Federal, processado por crimes contra o sistema financeiro e fraude cambial. Ele comandava uma das maiores redes bancárias clandestinas, nos anos 1990, no Rio de Janeiro, segundo a revista.
O país está parado há mais de dois anos enredado no golpe, agora nas mãos de um incompetente, rejeitado por cerca de 70% dos brasileiros, segundo pesquisas, prestes a ver seu arremedo de governo desabar. Um governo que só pensa em privatizar, subtrair direitos sociais e desfazer o que estava sendo feito.
Os investidores estão sem horizonte, arredios, enquanto a economia afunda e o desemprego dispara. Por mais que se anuncie a venda do patrimônio público, ninguém aposta uma pataca sequer no governo Temer. O risco Temer é o impasse.