A crise avança sobre as fronteiras
A crise avança sobre as fronteiras
No mar Mediterrâneo, embarcações superlotadas, naufrágios já vitimaram mais de 2.500 pessoas. Na Áustria, 71 corpos de pessoas mortas por asfixia, encontrados num caminhão.
Essas e tantas outras cenas dramáticas de migrantes desesperados tentando atravessar fronteiras para alcançar outros países onde possam trabalhar, viver em melhores condições, se misturam ao turbilhão de notícias que desaparecem todos os dias no túnel do tempo.
Cenas que apesar de tão chocantes, parecem ainda insuficientes para sensibilizar governantes, organismos internacionais, sobre a dimensão da crise.
O grande fluxo migratório que se desloca de regiões mais pobres para outras mais ricas está mostrando ao mundo que a crise econômica, social e política atingiu níveis ainda desconhecidos de grande parte do mundo.
Ao mesmo tempo, governantes e organismos internacionais revelam certa apatia, permanecendo indiferentes em relação à tragédia social.
A ONU não assume suas funções e a União Europeia parece tratar do problema apenas como algo passageiro.
Desde o começo do ano, a Europa recebeu mais de 340 mil imigrantes, sendo 100 mil em julho. Somente a Alemanha deve receber mais de 800 mil pedidos de asilo neste ano. No Reino Unido, apenas quatro em cada 10 imigrantes têm emprego.
O assunto tem sido tratado predominantemente na cobertura das grandes agências de notícia ocidentais, e, pela imprensa brasileira, como fenômeno social decorrente das guerras nos países de origem, como se as guerras fossem conflitos deslocados da crise mundial.
Não consideram o fato de os intensos efeitos da crise econômica internacional, originada nos Estados Unidos, em 2007, terem chegado a muitos países periféricos, recentemente. Assim como aconteceu com a China, tardiamente.
São omissos, não dizem que a cada ciclo da crise do capitalismo ampliam a tragédia social, os conflitos, intensificam migrações, formam cidades com amontoados de pessoas vivendo em condições desumanas a disputar as migalhas dos grandes centros abastados, dos bem nascidos.
Segundo dados do Fundo Monetário Internacional, entre 1970 e 2007, o mundo sofreu 127 crises bancárias sistêmicas, 208 crises cambiais e 63 episódios de não pagamento de dívida soberana.
Esses indicadores representam três crises bancárias, cinco crises cambiais e aproximadamente dois eventos de não pagamento de dívida soberana por ano.
As nações centrais vivem a era das bolhas, o mais novo veneno produzido pela financeirização da economia. As bolhas da chamada “nova economia” ou “ponto com”, nos anos 90, e a mais recente, a “bolha imobiliária”, nos Estados Unidos, em 2007, levam à ruína economias de importantes nações em todo o mundo, com repercussão avassaladora sobre nações periféricas, a maioria dependente de financiamento externo e do comércio internacional.
Vimos desmoronar nesta crise sólidas instituições financeiras e grandes empresas industriais nos Estados Unidos.
Vimos o governo daquele país injetar na economia trilhões de dólares dos cidadãos contribuintes norte-americanos, na tentativa de salvar grades bancos e grandes empresas.
Praticamente todas as grandes empresas e grandes bancos estão salvos, mas a população continua sofrendo com o desemprego crescente e com a estagnação econômica, não só nos Estados Unidos, mas em todo o mundo.
O governo Obama injetou, no auge da crise, cerca de US$ 600 bilhões no sistema financeiro, mediante compra mensal de títulos públicos.
O problema do setor imobiliário nos Estados Unidos persiste, porque a especulação atingiu níveis estratosféricos e o endividamento das famílias ainda não foi resolvido.
A crise levou de roldão países da União Europeia. Grécia, Irlanda, Espanha, Portugal, Itália, mais afetados, vivem submetidos a drásticos regimes fiscais e a cortes de investimentos, sem perspectiva, a curto e médio prazo, de retomada do crescimento.
A Grécia é o país mais impactado da União Europeia, tanto pela crise global quanto pela migração. No entanto, a Alemanha, que lidera os países de economia mais forte no continente, se recusa negociar um plano de retirada da Grécia da crise, que não seja apenas para salvar o capital, e que não sacrifique mais ainda o povo grego.
A dívida pública dos países ricos ainda está em nível sustentável, mas o endividamento aponta para um período de médio e longo prazo de crescimento a taxas pífias e altas taxas de desemprego.
Governos e organismos internacionais pouco avançaram na tomada de medidas capazes de deter os danos que a crise cambial está causando às economias em todo o mundo. Não há convergência no debate.
São fortes as resistências, principalmente por parte das nações centrais, de adotar medidas que beneficiem o conjunto da economia global.
Preferem se autoproteger, para não contrariar os princípios da globalização financeira idealizada por grandes grupos financeiros internacionais. Sequer avançaram no controle da volatilidade do capital.
A crise global do capitalismo se agrava e com ela os conflitos, as guerras, as tragédias econômicas, sociais, e, evidentemente, o desterro de imensos grupos de famílias de seus países de origem.
O drama das nações periféricas está estampado. O melhor seria, evidentemente, que as populações pudessem viver em paz, trabalhando dignamente em seus países. Mas, assim como essas nações receberam levas de imigrantes nos períodos das guerras, principalmente na Segunda Guerra, o que se espera é que as nações centrais também recebam decentemente os imigrantes, não os rejeite de forma xenófoba.
Os ajudem a superarem os danos da crise nas nações de economia mais fragilizadas, causados pela especulação financeira global, e tomem providências para que a solidariedade possa vencer a barbárie.