Não há mais nem restos mortais da “alegria do povo”
Manuel Francisco dos Santos, nosso Mané Garrincha, nosso “anjo das pernas tortas”, teve seu corpo exumado, em 2007, “para liberar espaço” no cemitério Raiz da Terra, em Magé/RJ. Descobriu-se que não se sabe o paradeiro dos “restos mortais” do nosso Garrincha.
O desprezo, a estupidez e a ignorância, parecem ter contaminado o Brasil, como micróbios. Estão comendo a história, a identidade cultural do povo.
O corpo foi exumado pela administração do cemitério sem nenhuma notificação à família.
Misturaram os ossos à terra que sem dignidade, sem história, sem importância nenhuma. Eram apenas “restos mortais”.
Filho de uma família de 15 irmãos, da cidadezinha de Pau Grande, Rio de Janeiro, Garrincha sofreu a dor da rejeição social desde cedo, mas foi no Flamengo, Fluminense e Vasco que doeu mais. Nas avaliações dos clubes, o preconceito, a discriminação, por ele ter as pernas tortas, pesaram mais que o talento.
Foi recusado pelos clubes. Mas o Botafogo o acolheu, para a felicidade do Brasil. Corações de todos brasileiros pulsaram forte de emoção, nos jogos das copas do mundo ao ver os drible desconcertantes e os gols de placa de Garrincha.
Garrincha é o nome de um pássaro, que costuma visitar as frestas dos telhados das casas, igrejas, onde fazem ninhos para os ovos e depois abrigar os filhotes. Garrincha não anda como outros pássaros. Ele anda aos pulinhos com os pés alinhados. Talvez por isso, Manuel Francisco dos Santos foi apelidado Garrincha.
Tornei-me botafoguense por causa dele, ouvindo os jogos no rádio, no Sertão da Bahia, narrados por Waldir Amaral, com suas frases curtas, descrições precisa das cenas dos dribles, que elevavam minha imaginação às alturas e me faziam sentir dentro do estádio, em tardes de domingo ensolaradas.
Para nossa tristeza, não há mais “restos mortais” da “alegria do povo”, como ele era chamado pela torcida e pelos cronistas esportivos. Mas há uma multidão de Garrinchas no Brasil, que, apesar da arbitragem contra o povo, vai vencer esse jogo.