A grande política e a política de grotão

Alkmin e DilmaAécio e Alkmin

TER, 11/11/2014 – 10:21
ATUALIZADO EM 11/11/2014 – 11:39

O Brasil tem uma Constituição moderna e instituições sólidas, republicanas, com ajustes a serem feitos, sim, mas nada que a grande política não dê conta de fazer. Vivemos um momento de consolidação da democracia, da cidadania, da afirmação de direitos, de colaboração federativa a fim de superar as desigualdades sociais e regionais.

De todos os ajustes institucionais, a reforma política se destaca como a mais urgente. Uma imensa mobilização popular comandada por partidos políticos e entidades civis está em curso para por fim ao financiamento de campanhas eleitorais por empresas privadas. Não é possível continuar com parlamentos e governos controlados pelo poder econômico.

Quem tem compromisso com o projeto de nação cidadã, de desenvolvimento sustentável, e com medidas necessárias para conter os efeitos da crise financeira internacional sobre a economia está fazendo a grande política.

O momento é de debate de projetos para o País. Não há mais lugar para a mesquinhez, para a política de grotão, para imprensa rastaquera. A sociedade brasileira amadureceu, se modernizou, quer avançar mais nas conquistas democráticas. A proposta de diálogo da Presidenta Dilma sinaliza nesse sentido.

Com o estado de São Paulo vivendo uma situação dramática com a escassez de água, já impactando a economia, sem falar na vida das pessoas, tendo que se valer da colaboração do governo federal, o governador Geraldo Alckmin deu um baile em Aécio Neves e José Serra, possíveis concorrentes à Presidência da República nas eleições de 2018, ao aceitar o diálogo com o governo federal.

E mais, estimulou os governadores eleitos, Simão Jatene, do Pará, e Beto Richa, do Paraná, ambos do PSDB, a fazerem o mesmo e não o oposicionismo inconsequente. Com isso, ele empurrou os dois concorrentes para mais à direita dele e tenta atrair o espectro de forças políticas do PSDB que não se identifica com a extrema direita.

Ao recusar o diálogo para enfrentar a crise, Aécio está fazendo a política pequena, de grotão. Lidera as forças de extrema direita que estavam sem lugar na democracia, trouxe para o centro da política brasileira, deu-lhes voz e espaço para ação, e quer continuar com elas, mesmo na contramão da história. Forças que estão bradando contra a democracia, pedindo a volta dos militares ao poder e o impeachment da Presidenta Dilma, democraticamente eleita.

Aécio, o ex-Presidente Fernando Henrique Cardoso, que publicou um artigo radicalmente contra a proposta de diálogo, e o líder do PSDB na Câmara, Deputado Carlos Sampaio, de São Paulo, que entrou com uma ação na justiça eleitoral pedindo “recontagem de votos eletrônicos”, estão entrando para a história como políticos fora do contexto, por não reconhecerem o resultado das urnas, as instituições de fiscalização e controle que estão investigando os casos de corrupção, a Justiça, a autonomia constitucional dos poderes públicos, e apostam na divisão do País, no impasse, na desestabilização política e da economia. Uma posição que pode impactar fortemente os investimentos em grandes projetos de infraestrutura nas áreas de petróleo, hidrovias, ferrovias, portos, aeroportos, hidrelétricas, refinarias, indústria da defesa, mobilidade urbana, e muitas outras em pleno desenvolvimento.

No xadrez da grande política, tudo indica que o deputado Eduardo Cunha, que flerta com parlamentares aecistias, pode não vir a ser presidente da Câmara dos Deputados. A política está sendo operada noutro nível. Os governadores do PMDB querem o diálogo com o governo federal. Por outro lado, são eles que definem a composição dos governos estaduais, em parceria com deputados e senadores. Essa construção está sendo feita longe dos holofotes de Brasília, mas que terá efeitos sobre a sucessão na presidência da Câmara.

As eleições deixaram claro que a oposição e parte da imprensa não conhecem o PT, não se dão conta da força e da capacidade de organização e mobilização do partido. A eleição foi definida a partir do momento em que a Presidenta Dilma demonstrou preparo muito superior ao do candidato Aécio nos debates e foram veiculadas, na campanha, as informações sobre os feitos do governo, bloqueadas pela imprensa familiar. Até então os apoiadores não tinham informações suficientes para defender a candidatura Dilma. As militâncias do PT e dos aliados foram às ruas e às redes sociais, enfrentaram a mídia comprometida com a oposição e viraram o jogo. Essa experiência mostrou que o governo não dispõe de uma política de comunicação, mas apenas de uma assessoria de imprensa. Não está sendo considerado que a informações sobre o que o governo faz é um direito do cidadão e um dever do Estado. Uma falha que precisa ser corrigida.

O fato é que a organização e o poder de mobilização do PT e das demais forças aliadas não podem ser ignorados, subestimadas. São partes da grande política que está sendo articulada. Para a posse da Presidenta Dilma, por exemplo, fala-se em botar 1 milhão de pessoas na Esplanada dos Ministérios. Espera-se a presença de grande número de chefes de estado das nações mais poderosas do mundo.

A política de grotão perde força e cresce a grande política.

(*) Laurez Cerqueira é autor, entre outros trabalhos, de Florestan Fernandes – vida e obra; e O Outro Lado do Real.

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